Leça da Palmeira Antropológica - IV

Entendemos que nesta nossa divagação sobre Leça da Palmeira também o património arquitectural que marca uma época e um estilo deve merecer a nossa atenção razão pela qual aqui trazemos a Casa de Chá da Boa Nova.
Integrado na disciplina de História da Arquitectura Contemporânea do Mestrado em Arquitectura e Urbanismo, que frequentámos na Universidade Fernando Pessoa, tendo que fazer a análise crítica de uma obra de Arquitectura Moderna, escolhemos por razões óbvias a Casa de Chá da Boa Nova.
Esta é uma obra que vimos crescer, primeiro com grande estranheza e surpresa pela sua localização e forma, mas que ao longo do tempo nos fomos habituando a apreciar e a compreender a forma notável como se integra na paisagem, a sua implantação, a riqueza de pormenores, os materiais utilizados, a sobriedade.
Valorizamos a Casa de Chá da Boa Nova, da autoria do Arqt.º Álvaro Siza Vieira, pois sentimos que estabelece de um modo genial, relações não conflituais entre o sítio antigo, o lugar existente e a criação arquitectónica. Consideramos esta obra inovadora de uma maneira de pensar a arquitectura.














A Casa de Chá da Boa Nova, foi construída integrada num programa de valorização turística da orla marítima, até talvez como remate da avenida que à data terminava junto ao farol aí existente, apesar de já estar projectada uma estrada ligando Matosinhos à Póvoa do Varzim, a qual ainda hoje não se encontra realizada.
A Casa de Chá, do ponto de vista de linguagem, esclarece o sentido do espaço interior, limpando de quaisquer reminiscências revivalistas, a liberdade de modelação de paredes e coberturas retomando plenamente materiais tradicionais, como por exemplo a madeira.
É neste contexto surgido com a remodelação do ensino na Escola Superior de Belas Artes do Porto, que apesar da conjuntura emergem arquitectos como Fernando Távora que viria ele próprio a conduzir um conjunto de novos arquitectos com novas arquitecturas.
É assim que pensamos poder dizer que a Casa de Chá da Boa Nova da autoria do Arquitecto Álvaro Siza Vieira tem pontos de ligação com elementos utilizados pelo Arquitecto Fernando Távora em obras como a Casa de Ofir, o Mercado da Vila da Feira e no Pavilhão de Ténis da Quinta da Conceição.
Contudo as características da Casa de Chá da Boa Nova são precursoras pela expressão de materiais como o betão, por vezes tratado como madeira, alvenarias revestidas a reboco areado com uma textura típica da tecnologia tradicional, dando a mancha irregular da cal branca o derradeiro efeito epidérmico ao conjunto.
Verifica-se uma adaptação morfológica ao local perfeita, predominando a cobertura que pode ser entendida como uma metáfora das ondas do mar rebentando contra os rochedos. Nesta fisionomia evocativa, o telhado desdobra-se como um pesado panejamento suspenso sobre a formação rochosa que simultaneamente abriga e expões o visitante perante a força do mar.
Na aproximação ao edifício o acesso faz-se a partir de um parque de estacionamento com um sistema de plataformas e escadas sinuosas e sempre ascendentes, seguindo um Calvário ou Via-Sacra que a Capela de S. João da Boa-Nova, ao lado, na sua simplicidade não tem.
Ao cimo deste caminho exterior, um telheiro em consola dá inicio ao percurso interior, sequencial e cerimonial que nas suas diferentes fases apresenta pictogramas da paisagem que variam à medida da nossa progressão no espaço.
Voltaremos oportunamente a este tema com um trabalho mais aprofundado sobre o tema e nessa altura referiremos a bibliografia consultada.

Eng.º Rocha dos Santos
in "A Voz de Leça" Ano LV - Número 10 - Janeiro de 2009